
O poeta Ferreira Gullar cultiva a crônica com a naturalidade de quem abre uma janela, estica o pescoço e se debruça para conversar com o leitor, entretê-lo, assustá-lo ou ameaçá-lo. Susto e ameaça andam juntos, por exemplo, quando diz que se amedronta diante das afirmações de que a crônica é um gênero seríssimo. Pura brincadeira, logo desmentida pela sua prosa leve, espontânea, sem-cerimônia, uma espécie de bate-papo descontraído com um amigo, o que não significa fugir da raia, se esquivar a temas sérios ou seriamente fúteis. Um caso sério. O namoro com a crônica começou em 1950, no Maranhão e prosseguiu, de maneira esporádica e quase jocosa, na revista Manchete, no Rio de Janeiro. Gullar, em algumas ocasiões, substituiu Rubem Braga, o sabiá da crônica, assinando os trabalhos com as iniciais R. B. Podia não ser um sabiá, mas já cantava como um pássaro profissional. Mas, foi no Jornal do Brasil, no período de 1957-1962, que deixou de ser um bissexto para se entregar ao exercício periódico do gênero. Exercício magnífico, no qual o cronista aguçava todas as qualidades de observador atento à realidade cotidiana, dos fatos políticos que afetam o povo e o país aos casos banais, seus preferidos, aliás, com os quais, com humor e simpatia, escreve as suas melhores crônicas. A simpatia humana, numa outra perspectiva, está presente também nas crônicas em que aborda assuntos "desagradáveis": as misérias do povo, a exploração econômica, a opressão. O cronista parece então se transfigurar, sem papas na língua, mas sem jamais perder a elegância, solta a voz com a eloquência e a indignação de um profeta bíblico, como se pode constatar em "A Multinacional Corrupção". As Melhores Crônicas Ferreira Gullar abrangem um período de quase cinquenta anos de atividade de um cronista atento à realidade dos humanos e à sua infindável comédia.
Author

Ferreira Gullar is the pen name for José Ribamar Ferreira, Brazilian poet, playwright, essayist, art critic, and television writer. In 1959 he formed the "Neo-Concretes" group of poets. Living in Chile, in 1975, Ferreira Gullar wrote his best known work, "Poema Sujo". He was exiled by the Brazilian dictatorial government that lasted from 1964 to 1985. The poem states that the persecution of the exiles was growing, many were being found dead, and, thinking hypothetically of his death, he decided to write his last poem. He spent months writing this poem with more than two thousand verses, which brings forth his memories of his childhood and adolescence in São Luís, Maranhão and the anguishes of being far from his land. Ferreira Gullar read the poem at Augusto Boal's house in Buenos Aires, in a meeting organized by Vinicius de Moraes. The reading, recorded on tape, became well known among Brazilian intellectuals, who tried to guarantee Gullar's return to Brazil in 1977, where he continued writing for newspapers and publishing books. He was considered one of the most influential Brazilians of the XX century by Época magazine. Gullar keeps a weekly column at Brazilian newspaper Folha de S.Paulo, publishing it every sunday.