
"Gianecchini enfim se permitiu encarar o pensamento proibido: Pode ser que tenha chegado a minha hora. No que ele olhou pela primeira vez para a cara da morte, a sua morte, bem de frente, foi tomado por uma calma profunda. Por um momento perdeu de vista os médicos, as enfermeiras, a empresária, a mãe, os parceiros profissionais e afetivos, a legião de fãs. Enxergou com clareza o verdadeiro lugar de todo mortal em sua condição mais pura: a solidão. E sentiu-se forte nesse lugar. Entendeu que fora exatamente dali que, ainda menino, vislumbrara o seu caminho - um caminho que o diferenciava de todos os membros da sua família, de todos os exemplos que havia à sua volta no interior, de tudo que ouvira na escola. Sozinho, deixara Birigui de ônibus e ganhara o mundo. Agora, a sós com seu medo, Giane foi sendo tomado de certa excitação. O que seria aquilo? Se não era masoquismo, devia ser coragem. Estava pronto para a travessia. Qualquer uma."